Seus rendimentos de CRI e CRA são isentos de IR e devem ser declarados

Está próximo o prazo final para envio da declaração de imposto de renda de 2020*. Conversamos com um dos maiores tributaristas de renda imobiliária no Brasil, Dr. Ricardo Lacaz, sobre as regras de isenção de IR para CRI, CRA e fundos imobiliários. Ele comenta também o que poderia ser feito para incentivar o ambiente de investimentos.

*Há perspectiva de prorrogação do prazo até 31 de julho, conforme projeto de lei aprovado no Senado e que segue para votação na Câmara dos Deputados.

Os investidores de CRI e CRA devem atentos a quais pontos na declaração de imposto de renda?

Ricardo Lacaz: Os rendimentos decorrentes dos juros do papel de CRI ou de CRA, como também os ganhos de capital – auferidos na venda desses papéis no mercado – não são tributados, são expressamente isentos, mas qualquer rendimento, mesmo que não pague tributo, deve ser declarado.

Essa informação do rendimento isento na DIR é favorável ao contribuinte, porque ele tem registrada a origem dos recursos que fazem frente aos gastos efetuados. Vamos supor um contribuinte que teve, por exemplo, R$ 100 mil reais de ganho de um CRI ou CRA durante o ano. Ele não tinha nenhum outro rendimento e gastou R$ 50 mil desse valor. Se ele não informar o rendimento na declaração de imposto de renda, ficará com os R$ 50 mil reais descobertos perante o Fisco. Como é que ele viveu durante o ano se ele não teve rendimento para isso?

Então, declarar esses rendimentos à Receita Federal é algo importante para que você não venha a ter um problema futuro com o próprio Fisco, pela ausência dessa informação.

Qualquer valor de rendimento deve ser declarado, por menor que seja?

É importante não confundir: uma coisa são os rendimentos e os ganhos de capital de um determinado título serem isentos. Outra coisa é a obrigatoriedade de declarar uma coisa que é isenta ou não.

A partir do momento em que você está no rol dos contribuintes que são obrigados a entregar a declaração de IR, deve declarar os rendimentos do CRI e do CRA. Não existe uma faixa de valor em que não precise declarar. É que nem a caderneta de poupança: você pode ter R$ 10 milhões na poupança. Se teve rendimento, você declara o rendimento, mesmo este não sendo tributado.

A isenção de IR também se aplica a fundos imobiliários?

Em fundos de investimento imobiliário (FII) o ganho de capital é tributado. Já os rendimentos pagos periodicamente pelo fundo podem ser isentos, desde que sejam cumpridos três requisitos que caracterizam a pulverização do FII – ter 50 ou mais cotistas, ser listado em bolsa de valores e o cotista investidor não ter mais de 10% do fundo.  

A grande maioria dos fundos de mercado são isentos, por se enquadrarem nos requisitos para pulverização (citados acima). Mas há situações em que o rendimento é tributado. Por exemplo, em um fundo pequeno, com menos de 50 cotistas, mesmo que você tenha abaixo de 10% do fundo terá retenção de imposto na fonte. E essa retenção é de 20%.

Então, para ficar claro: rendimento é a percepção do que o ativo lhe paga – os juros, vamos colocar dessa forma. Ganho de capital é o lucro ou prejuízo que você tem na venda de cotas do fundo.

Há limite para a tributação dos ganhos de capital nos FII?

Não há limite. Você tem que pagar mesmo que o ganho seja, por exemplo, de R$ 5 mil. Porque a Receita soltou uma solução de consulta informando que o limite de R$ 20 mil de isenção no ganho de capital não se aplica a cotas de fundos imobiliários. Então, segundo o entendimento da Receita ele é tributado. É verdade que há muita gente que esquece de declarar esse ganho de capital, mas ele é tributado.

Então, para fixar: em títulos de CRI e CRA o rendimento e o ganho de capital são isentos (art. 55 da IN RFB 1585/2015, essa é a base legal).

Já o FII é tributado no ganho de capital (venda das cotas do fundo), mas é isento no rendimento, desde que atenda os requisitos já citados.

Um dia a isenção para o rendimentos e ganho de capital de CRI e CRA poderá acabar?

Há muita discussão sobre isso e já houve ameaças concretas. Isso já foi objeto de projetos de lei, instruções, minutas de medida provisória… seja no âmbito da reforma tributária, seja em uma alteração esparsa da legislação. Então, o risco sempre existe.

Para os papéis de renda fixa, principalmente CRI e CRA – e LCI e LCA também -, a tendência é que a isenção deveria, juridicamente, respeitar o prazo de vencimento do papel. Então, se você compra um CRI de 10 anos, mesmo que a lei venha a ser alterada, ela deve respeitar, pelo direito adquirido, a isenção daquele papel.

Já as cotas de FII como não tem prazo determinado, então isso não é tão claro. Há uma discussão jurídica mais complexa para saber se haveria direito adquirido em relação às cotas.

Há perspectiva para que isso aconteça em um futuro próximo?

A retirada da isenção é uma ameaça sempre constante, continuamos com essa espada na cabeça. Mas esse risco não é novo. E há dificuldade grande para você tirar a isenção desse mercado, porque seria tirar um recurso que é destinado à atividade produtiva. Então, seria um tiro no pé do próprio governo porque ele perderia arrecadação em última instância, segundo vários estudos feitos.

O dinheiro que entra em CRI e CRA, entra para incorporadoras, para o mercado de agronegócio, entra na atividade produtiva ¨na veia¨, como falamos. Porque esses papéis são uma forma de desintermediação financeira. O recurso não vai para o banco; vai direto para o empreendedor, para a geração de negócios que pagarão impostos.

Se o governo tirar a isenção do papel, diminuiria muito os recursos de investidores para esse mercado. Seria tributar algo que provavelmente ou não vai existir ou vai ter uma quantidade muito menor, ou seja, literalmente você mata a “vaca”, porque não terá mais leite para tirar se tributar o CRI ou CRA. Provavelmente, voltaríamos a ter um cenário de intermediação financeira, com empreendedores pagando taxas, comissões e spread bancário. Ou seja, você perde a eficiência de um canal direto entre o investidor e o empreendedor, que é justamente a desintermediação.

Então, sempre que o governo discute essa tributação ele é informado sobre os efeitos maléficos de se tirar a desintermediação financeira. E o governo tem entendido isso, por muitas vezes.

Qual a sua visão sobre a perspectiva de reforma tributária no País?

Reforma tributária é um tema que gera paixões, temos que entender isso. Diferente da reforma da previdência ou a própria reforma administrativa, que têm questões centrais quase sempre na sociedade.

Já a reforma tributária não tem esse consenso e existe um ingrediente político muito grande. Por exemplo, deve se taxar o serviço de saúde? Deve se taxar a educação de maneira igual à venda de produtos da cesta básica? Deve se taxar a educação igual à venda de veículos ou de produtos da linha branca?  São questões que envolvem decisões políticas e que, invariavelmente, desagradarão os setores que se sentirem prejudicados. Então, é uma reforma em que o cobertor é curto. É muito difícil agradar a todos e daí está a dificuldade macro de se implementar a reforma.

Acho que é algo distante, politicamente. Já estivemos mais próximos da reforma tributária. Talvez na nova composição do Congresso, com novos presidentes da Câmara e do Senado, consigamos mobilizar os deputados e senadores e fazer avançar essa agenda, seria muito bom para o País, mas temos que aguardar. Então, não acho que seja algo provável no curto prazo.

Enquanto não se tem uma reforma tributária macro, o que poderia ser feito para fomentar o cenário de investimentos?

Existe uma “linha” de reforma tributária, que gosto muito, que é reformar o que está errado, e isso deve ser feito e deveria ter sido feito. A crítica que fazemos é que nesse momento se pensa numa reforma macro, mas se esquece dos ajustes micro que devem ser realizados.

O exemplo mais claro que damos é o da reforma trabalhista. Foi feita muita coisa macro, mas também endereçadas questões específicas, como, por exemplo, de atribuir o custo de sucumbência, o custo de pagar um advogado, caso um trabalhador entre com ações aventureiras. Foi um ajuste pequeno, mas que diminuiu em mais de 50% as ações trabalhistas e proporcionou um reequilíbrio na relação judicial específica entre o trabalhador e o empregado.

Há uma lista enorme de pequenos ajustes que deveriam ser feitos na tributação, em relação a investimentos. Vou citar um exemplo: os fundos imobiliários são tributados em 20% no ganho de capital. Sendo que a alíquota para ganho de capital em outros investimentos é de 15%. Porque não se ajusta isso? Porque os ganhos da venda de títulos de CRI e CRA são isentos e os das cotas de fundo imobiliário não?

Então, existe uma série de pequenas coisas que poderiam ser feitas por lei ordinária, sem precisar de uma grande reforma. Diminuir o contencioso fiscal, por meio de um redesenho do processo tributário é um exemplo do que pode ser feito, que não precisa ser em nível constitucional e poderia diminuir muito o custo Brasil, o custo de ser empresário ou ser contribuinte no país.

Fazendo uma analogia final, é como quando você vai fazer uma reforma na sua casa. Você contrata o arquiteto, e enquanto ele está fazendo o desenho e você o orçamento da obra, o cano da cozinha ou do banheiro fura ou o telhado começa a vazar. O que você faz? Fica esperando reformar tudo para resolver o problema ou você conserta logo o cano da cozinha, o telhado? Você vai consertando as coisas que estão quebradas. Isso é algo do cotidiano.

Então devemos continuar a discutir uma reforma tributária e ter o objetivo de fazer uma grande reforma no País. Mas, por outro lado, não podemos esquecer de fazer a lição de casa e ir melhorando nosso sistema tributário, solucionando as pequenas coisas que trazem ineficiência para o sistema.

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