Fernando Brasileiro: “É preciso coragem para fazer acontecer”

A True Securitizadora conquistou a 1ª posição, pelo terceiro ano consecutivo, nos rankings de número de operações realizadas e montante emitido de CRI – Certificados de Recebíveis Imobiliários. Foram R$ 5,66 bilhões distribuídos em 56 operações – quase um quarto (23,4%) do total realizado pelo mercado em 2019. O CEO da True, Fernando Brasileiro, comenta nesta entrevista o que o motivou a empreender nesse mercado, a trajetória da companhia e sua visão sobre o atual cenário de incertezas e oportunidades.  

Como a empresa alcançou a liderança no mercado brasileiro de securitização?

Um fato curioso é que nós já nascemos líderes de mercado. Conquistamos a primeira posição do ranking de operações de CRI já em nosso ano 1 de emissões, que foi 2013. Desde então, ficamos sempre entre os três primeiros lugares do ranking e, desde 2017, ficamos em primeiro lugar por três anos consecutivos. De 2017 para cá, nunca fizemos menos do que 40 operações por ano.

Como funciona essa classificação? 

Existem dois rankings que os securitizadores sempre olham. Um é o de volume, que considera o valor total emitido pela securitizadora em um ano – mas pode ser um pouco enganoso, pois uma única operação de grande valor poderia te posicionar entre os primeiros. O outro ranking é o número de transações realizadas e esse é o que mais nos interessa, pois demonstra o nível de atividade e o alcance da empresa, a capacidade de originação e colocação de operações no mercado. Na prática, nós lideramos pelos dois rankings principais.  

O que o motivou a empreender com securitização? Que oportunidade de mercado você viu?

Em 2012, eu era presidente da Cibrasec, que foi a primeira securitizadora fundada no Brasil, com 23 bancos como sócios. Estava há quatro anos na empresa e sentia que minha missão estava cumprida. O mercado de securitização estava em franco crescimento e era um setor intelectualmente desafiador, o que me motivava. E mais: o mercado de capitais brasileiro começava a se expandir e ser mais independente das grandes instituições financeiras. Surgiam novas gestoras, securitizadoras, distribuidoras de títulos e valores mobiliários – players que precisavam de fontes de funding alternativas às contas correntes, depósitos à vista que os bancos ofereciam, mas não tinham acesso. Então, vi a oportunidade: a securitização seria cada vez mais uma necessidade para os novos players de mercado, principalmente os relacionados ao setor imobiliário e o agrícola, que necessitavam de financiamento de médio e longo prazo. 

Como foi o desafio de empreender?

Essa oportunidade de mercado já era um pouco óbvia para quem conhecia o setor. Mas entre algo ser o óbvio e você ir lá, ter a coragem de fazer acontecer, não é para muitos. É difícil ver altos executivos abrirem mão de cargos em grandes empresas e irem empreender: há riscos pessoais, patrimoniais…  Mas aquela era uma aspiração pessoal. Conversei com os meus futuros sócios, o Árley e a Beth, que trabalhavam comigo na Cibrasec e resolvemos abrir a securitizadora. Em um primeiro momento, a ideia era fazer mais estruturação de negócios imobiliários do que securitização, mas o nosso networking e conhecimento de mercado era tão bom que acabamos focando na segunda. E deu no que deu, ainda bem! Em nosso primeiro ano de emissões, fizemos 21 operações no valor de R$ 5 bilhões. Incluindo o maior CRI já emitido na história do mercado, a securitização da carteira de crédito imobiliário do Itaú, no valor de R$ 4,4 bilhões. 


A True responde por uma fatia importante do mercado, quase um quarto do total de operações emitidas.

Sim, temos uma posição dominante nesse aspecto. E isso nos dá uma visão privilegiada do que o mercado está fazendo e de quais são as tendências. É muito difícil ser lançada uma operação que nós já não vimos. 

Quais foram os segredos para o sucesso da empresa, as decisões acertadas que vocês tomaram?

Existem algumas coisas. Primeiro, os executivos fundadores eram profissionais com bastante experiência e perfis muito complementares – tanto do ponto de vista de conhecimento de mercado, técnico, networking, experiência de administração de negócios financeiros de empresas. Outro aspecto é que, desde o início, nós sabíamos que esse era um tipo de negócio que precisava estar estruturado em bases muito sólidas e profissionais. Procuramos gente experiente para trabalhar conosco e formar um time. Não teríamos feito aquele número de operações no primeiro ano sem uma estrutura bem montada e um grupo de pessoas que conhecesse profundamente o negócio. E o terceiro ponto é o investimento em tecnologia, pois é um negócio de escala: hoje temos mais de 250 operações ativas e entre 25 mil a 30 mil recebíveis imobiliários. Ao longo da nossa história, foram mais de 300. É preciso ter sistemas para processar, cobrar, controlar e garantir que essas operações performem adequadamente. E nos preparamos para isso, desde o início. 

O que mais fez a diferença para dar certo?

Nós sabíamos, tínhamos a convicção muito grande de que possuíamos todos os requisitos, recursos intelectuais e técnicos para fazer o negócio crescer. Havia uma oportunidade: o mercado de capitais estava se abrindo e o mercado brasileiro pedindo crédito de médio e longo prazo, principalmente no setor imobiliário e depois o agrícola. É assim: se você tem a convicção, acredita, tem que investir no seu negócio para fazer uma empresa profissional. Acho que esse foi o grande segredo. 

Uma securitizadora não pode ser amadora e nem mal estruturada. Quem acessar o nosso site poderá ver as principais informações sobre as nossas operações. Se o investidor quiser, basta usar seus dados de acesso e ele verá as informações de todas as operações que ele carrega – desde contratos, atas, até o P.U. diário. Para fazer isso, é necessário ter tecnologia e processos muito bem estruturados e automatizados. Essa questão da transparência é fundamental e é uma obrigação legal. 

O cenário econômico foi abalado pela pandemia do novo coronavírus (COVID-19) e há muita imprevisibilidade sobre o futuro. Há alguma janela de oportunidade para quem investe e quem toma recursos com CRI e CRA?

É óbvio que esse segmento, como todos os outros do mercado financeiro e do mercado de capitais, será afetado pela situação mundial e, especificamente, pela situação do mercado interno, que é volátil. Há uma tendência a uma recessão econômica, eventualmente até uma depressão, a depender do quanto essa crise da COVID-19 vai durar e quais serão seus efeitos sobre a economia. Por outro lado, o empreendedor sempre tem que buscar oportunidades. Houve muita perda de valor das empresas, várias sofrerão impactos de médio prazo na sua performance operacional e financeira. E muitos investidores vão se retrair do mercado de capitais, principalmente o de renda variável. Outro ponto: os níveis de juros estão baixos. Já vinham em uma trajetória de queda e, agora, com as medidas de estímulo nos diversos mercados ao redor do mundo para tentar contrapor o efeito dessa pandemia na atividade econômica, os juros baixaram ainda mais. Nos EUA estão por volta de zero agora.

E onde estão as oportunidades?

As alternativas de investimento com crédito estruturado, com diversos aspectos de mitigação de risco. É rara a operação de CRI e CRA que não tem uma garantia real: normalmente um imóvel, no imobiliário, ou um estoque no caso do agronegócio. Outra coisa: a garantia de recebíveis gera uma pulverização, diluição de riscos. O CRI nunca é um empréstimo puro, ele é uma estrutura: tem concessão de crédito, desconto de recebíveis, garantias reais, controle sobre os recebíveis que são apartados… São estruturas que permitem uma mitigação de risco melhor, são de renda fixa, e possibilitam uma precificação mais competitiva por serem de médio e longo prazo. A minha sensação é que se passarmos por esse olho do furacão bem estruturados, bem organizados, como a True está, a tendência é que teremos uma vantagem, no sentido de mostrar para os investidores e para os tomadores que a securitização através dos CRIs e dos CRAs é uma alternativa que vai estar presente e que lida bem com riscos em momentos de stress. Como já se comprovou na crise de 2008. 

Para encerrar, quais as tendências que a True vê para o crescimento do mercado?

Uma coisa que me parece uma tendência é o crescimento cada vez maior dos fundos de CRI, que permitem uma democratização do investimento. Já há um volume muito grande de investidores pessoa física que investem em CRI e CRA. Nós temos acima de 65 mil investidores PF que carregam papéis emitidos pela True. A primeira tendência é alta renda, são investidores mais sofisticados, mas quando se atinge 65 mil já há uma certa democracia na distribuição de papéis. Há pessoas que têm R$ 1.000, outras R$ 70 milhões de reais investidos. Quer dizer, você atinge desde um investidor mais jovem, mais modesto, até investidores de alta renda, muito capitalizados e extremamente sofisticados. Então, à medida que os fundos vão crescendo, eles dão mais acesso e facilitam a liquidez do papel. Outra coisa é que a CVM fez um esforço nos últimos dois anos para melhorar a transparência do mercado de CRI e CRA, o report, controle de riscos, acesso à informação por parte do investidor… Então isso dá mais segurança para o mercado, especialmente neste momento.